quinta-feira, 15 de novembro de 2012

 Caminhou-se lentamente sobre o assoalho que transmitia frieza pra entre teu corpo pequeno, torto e desajeitado. Sentou-se sobre uma cadeira de madeira velha, abriu a janela e deixou a luz do poste iluminar a pequena mesa que aos poucos ia sendo devorada por cupins. Abriu a gaveta a direita, tirou uma folha amarelada com uma caneta preta quase ao fim, apoiou ambos sobre a mesa, deu uma leve suspirada com o vento forte que batia contra seu rosto e começou a escrever, engolindo cada lágrima que seu corpo cansado escorria.

          Oi, querido

Como você está? Eu creio que bem e isso me deixa muito feliz! Necessito muito saber como anda suas viagens entre seu mundo tão enorme, como anda teus sentimentos e sua mania compulsiva por livros, músicas e flores. Será que em tua casa nova ainda há lugar para um pequeno jardim? Com cheiros de rosas? Acho eu que não, rosas lhe permitem lembranças que sinto por alguns segundos que já não pertence mais a você. E eu entendo, por mais difícil que seja, eu lhe entendo! Hoje eu acordei bem cedo, coloquei o Joaquim para tomar o primeiro banho dele sozinho e você já deve imaginar o que aconteceu.. O banheiro inteiro ficou alagado, mas eu fui boba, fiquei mais ansiosa com o ponto perfeito do café do que do nosso próprio filho. Após essa confusão enorme, o levei para passear pelo jardim imenso que fica a dois quarteirões daqui, ele brincou com as flores e com os bichinhos - as formigas mesmo - Depois voltamos para casa e fomos ao porão, sentamos sobre o assoalho, pegamos uma caixinha de giz e começamos a rabiscar sobre as paredes, ele escolheu o verde, sua cor preferida, lembra? Eu fiquei com o rosa e desenhei você, desenhei pássaros, desenhei o que fomos e o que seremos para sempre! Rimos um bocado, subimos, brincamos na banheira, comemos uns biscoitos misturado ao leite e depois o coloquei para dormir, sentei sobre o sofá, passei os canais várias vezes, como sempre faço e você sabe dessa minha mania chata, fiquei ouvindo o barulho do relógio velho que sua mãe nos deu, esperei as horas passarem, engolir choro e vim escrever-te, como o de costume. Esse foi só mais um dia.. Mais um dia de flores mortas, de pássaros em silêncio, de pouco sangue, de poucas veias e forças. Eu espero que você esteja realmente bem e feliz, espero que esteja sorrindo, porque o teu sorriso, querido.. É o sorriso mais lindo que eu já pudi olhar, tocar e beijar.

Deu três dobradas no papel, pegou um envelope na gaveta esquerda e guardou com cuidado a carta, como se estivesse embrulhando uma lembrança, assinou seu nome, seu endereço, deixou a última lagrima que restava cair, levantou-se e andou até o teu armário, pegou um banco, subiu e com muito esforço, conseguiu alcançar o pequeno caixote pintado de verniz, abriu e guardou a carta, como fazia todos os dias. Desceu do pequeno banco, deitou-se sobre a cama e rezou, implorando ao teu Deus, que teu amor a respondesse, por algum dia conseguir dormir em paz.

Larissa Linhares